A LEI 10.639/03 E A NARRATIVA HISTÓRICA: CURRÍCULO, PODER E GOVERNAMENTO

CAROLINA ASSMANN, MOZART LINHARES DA SILVA

Resumo


O presente trabalho apresenta-se como um recorte das atividades e pesquisas desenvolvidas ao longo do projeto "Histórias invisíveis de Vida: Sujeitos negros, subjetividade e educação na região do Vale do Rio Pardo - RS",no qual atuo como bolsista Probic-FAPERGS, coordenado pelo professor Dr. Mozart Linhares da Silva. É válido salientar que as problemáticas, bem como as discussões suscitadas ao longo do projeto, apresentam-se como uma continuidade das pesquisas sobre educação e etnicidade que vêm sendo desenvolvidas nos últimos sete anos, sob a mesma coordenação. O trabalho que apresento aqui tem por objetivo a análise da produção de sentido de dois dispositivos legais: a Lei 10. 639/03, que institui a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-brasileira na Educação Básica, e as Diretrizes Curriculares Nacionais de 2004 para a "Educação das Relações Étnico Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana". Problematiza-se, nesse sentido, como esses dispositivos legais inferem no currículo escolar, produzindo o que podemos chamar de uma nova narrativa histórica acerca da trajetória das populações negras no país. É importante ressaltar, acerca da concepção de História presente no documento das DCN/04, ao passo que ao propor o ensino de uma História e cultura afro-brasileira está inferindo que há uma história "verdadeira", coloca a possibilidade de uma História nacional que "resgate" um passado "verdadeiro" da trajetória das populações negras no país, a qual necessita ser ensinada, assumida e valorizada, em contraposição a uma história deturpada que teríamos hoje. Sendo assim, essa contra-história proposta pela reforma curricular vai de encontro à narrativa histórica tradicional, colocando em xeque a valorização do passado colonial português, produzindo uma nova narrativa que acaba por ressignificar e reposicionar o papel do sujeito negro na formação histórico nacional. Lançando mão do uso das chamadas ferramentas foucaultianas para análise dos dispositivos legais, bem como do currículo propriamente dito, foi possível perceber como essas contra-narrativas atuam no currículo escolar e influem nos processos de constituição e subjetivação dos sujeitos negros no país, provocando nos sujeitos um olhar sobre si a partir das condutas e "verdades" construídas sobre o ser negro no Brasil. Assim, de acordo com as discussões suscitadas ao longo das pesquisas, observou-se como a reforma curricular instituída pelos documentos citados se constitui como importante dispositivo pedagógico de regulação e governamento, de forma que, ao propor uma releitura da narrativa histórica da nação, acaba por produzir e legitimar novas "verdades" sobre as relações raciais no país. Nesse sentido, é importante destacar ainda, acerca do caráter formativo do currículo, sobretudo no que se refere à forma como este infere de maneira direta e indireta nos processos de subjetivação dos sujeitos no ambiente escolar, produzindo novos modelos discursivos acerca do diferencialismo identitário.


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