ANÁLISE INSTITUCIONAL: OS INSTITUÍDOS QUE CERCAM UM SERVIÇO DE ACOLHIMENTO PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
Resumo
As instituições são ações, comportamentos e discursos que se naturalizam na sociedade, criando padrões que são reproduzidos como verdades dadas, ou seja, regras sociais. Assim, elas se tornam algo implícito, não dito, uma vez que não são escritas em lugar algum, mas impostas, estando presentes no cotidiano de forma instituída. Orientando-se por esses conceitos, o presente trabalho originou-se das experiências decorrentes do Estágio Básico II- Processos Institucionais, do curso de Psicologia da UNISC, o qual possibilitou uma breve vivência junto ao Serviço de Acolhimento para Crianças e Adolescentes, localizado na Região do Vale do Rio Pardo, RS. O Serviço de Acolhimento para Crianças e Adolescentes é entendido como campo de intervenção, já o campo de análise situa-se no contexto da Política de Assistência Social. Considerando as discussões de Goffman (1987, apud BENELLI, 2004, p. 238-9), esse Serviço pode ser pensado como uma instituição total, que ele caracteriza como “estabelecimentos fechados que funcionam em regime de internação, onde um grupo relativamente numeroso de internados vive em tempo integral”. Deste modo, objetivou-se conhecer e compreender quais instituições e instituídos estão presentes nesse local, bem como as relações estabelecidas. Para tanto, a metodologia utilizada pautou-se em observações registradas em diário de campo, tornando possível a integração dos fatos experienciados e a reflexão sobre aquilo que está instituído. Além disso, foram realizadas entrevistas com os profissionais e os acolhidos, além de pesquisas bibliográficas. No decorrer do processo, entenderam-se algumas questões como instituídas, entre elas a loucura, a medicalização, a agressividade, o confinamento e a segregação. Esses instituídos surgem por meio dos discursos e das cenas vivenciadas dentro do local, existindo como um fato natural, regulando comportamentos e tendo sua existência implícita. Exemplos de “loucura”, enquanto um instituído, são verificados na fala de uma pessoa: “Isso aqui é um manicômio infantil”. Ela também é percebida nos relatos dos acolhidos, que insistem em chamar um adolescente de louco, doente, pois ele tem um diagnóstico de retardo mental. Portanto, é notável o quanto a figura do louco e do doente produz visibilidade àquilo que está instituído, o quanto os analisadores espontâneos falam da instituição. A medicalização complementa esse discurso, pois, ao conceber as crianças e adolescentes como doentes mentais, se produz uma crescente medicalização desses indivíduos. A agressividade também é muito forte, estando presente na dinâmica do local e nas relações que são construídas. O confinamento rege o comportamento de todos que estão ali, obrigando-os a ficarem isolados, pois, ao redor, há portões chaveados, grades e muros altos. A segregação atua através da estrutura arquitetônica, também podendo ser correlacionada ao que se nomeia aqui como instituído da loucura, onde o adolescente considerado doente mental é sempre isolado dos demais. Contudo, percebe-se que mesmo nesse ambiente rígido há espaço para o instituinte, pois, no momento em que um adolescente foge da casa, pulando o muro para demonstrar seu descontentamento, ele revela-se como transformador do instituído. Com esse ato, aquilo que poderia ser visto como passível de punição, é entendido pela equipe como uma possibilidade de existência, assim, novos acordos tornam-se possíveis, por exemplo, autorizações para pequenas saídas.
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