A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA E O MOVIMENTO DE AUTOGESTÃO DE ALUNOS: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA
Resumo
Relatamos a experiência de autogestão de um grupo de alunos da disciplina de Psicologia Comunitária II, do Curso de Psicologia da Unisc. Durante a discussão do programa da disciplina, os alunos propuseram a alteração de parte do conteúdo programático previsto, sugerindo estudar a situação dos refugiados senegaleses e haitianos vindos ao nosso país. A temática dos refugiados foi aceita pelo grupo, iniciando uma busca por histórias de vida de senegaleses e haitianos residentes na região dos Vales do Rio Pardo e Taquari. Nesse momento, a turma subverte a forma como convencionalmente ocorrem os processos de ensino e passa a constituir uma trajetória protagonista e implicada com a construção compartilhada do conhecimento. Perguntávamos: como esses estrangeiros são acolhidos? Em quais condições vivem? Nesse processo, compreendemos as diferenças jurídicas e políticas entre refugiados e imigrantes. No caso dos haitianos e senegaleses, eles chegam ao Brasil como imigrantes, o que os priva do amparo político concedido aos refugiados pelo Estado. Com o objetivo de identificar instituições e órgãos comprometidos com os imigrantes, os alunos visitaram Secretarias de Desenvolvimento Social, Centros de Referência em Assistência Social (CRAS), Universidades, escolas e Igrejas. Entendemos que os haitianos chegam aos Vales do Rio Pardo, Taquari e regiões vizinhas em busca de emprego e de condições dignas de vida. Em Lajeado, identificamos ações em desenvolvimento, como um curso de português para estrangeiros e a contratação de um haitiano no CRAS, para acolhimento de outros imigrantes. A metodologia baseou-se em discussões coletivas e democráticas, marcadas pela autonomia dos acadêmicos, os quais colocaram em curso o que pressupõe a Psicologia Comunitária. Com a discussão das ações em grupo, identificamos uma família de haitianos, cuja necessidade de trazer os dois filhos menores deixados com a avó no Haiti mobilizou a turma. O casal e o filho mais velho vivem e trabalham no Brasil há cinco anos. Como resultados, citamos a realização de uma reunião aberta para discutir mecanismos institucionais de apoio aos imigrantes e a essa família, de modo específico, com a participação de representantes da comunidade acadêmica e setores como saúde, assistência social, movimentos sociais, poder legislativo, imprensa, entre outros. Diante da inexistência de formas de amparo institucionalizadas aos imigrantes com filhos no país de origem, foi desencadeado um movimento de levantamento de fundos para trazer os filhos do casal para o Brasil. Como considerações finais, entendemos que o processo de mobilização e organização dos alunos está em consonância com os princípios mais radicais da Psicologia Comunitária, no que tange à autonomia e à autogestão. No entanto, uma das ações empreendidas, nomeadamente a arrecadação de fundos, pode ser entendida como uma ação assistencialista. Esta discussão é pertinente, pois traz à tona a problematização sobre o modo como a crítica ao assistencialismo, tão necessária em momentos anteriores, pode hoje colocar-se a serviço de práticas que reforçam o individualismo e a insensibilidade frente àqueles que peregrinam pelo mundo ante a impossibilidade de permanecerem em seus países de origem. Questionamos: qual seria a dimensão atual entre assistência e solidariedade? Até onde a Psicologia comunitária deve se envolver com as questões apresentadas? Até que ponto o medo de incorrer em assistencialismo nos deixa de braços cruzados sem nada fazer?
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