COMIDA, DESPERDÍCIO E RESSOCIALIZAÇÃO: A PRODUÇÃO DE ALIMENTOS NO COMPLEXO PRISIONAL DE SANTA CRUZ DO SUL

Letícia Wegner Bordignon, Lavínia Veiga de Lima, Everton Luiz Simon

Resumo


A população carcerária enfrenta uma série de problemas de sobrevivência dentro dos presídios brasileiros. Muitos incluem a questão da alimentação de péssima qualidade, problemas de segurança alimentar, superlotação de celas e doenças que, muitas vezes, podem levar à morte dos detentos. O presente trabalho está vinculado ao projeto PROSAÚDE – Programa de Reorientação da formação profissional – Subprojeto: Saúde prisional, sendo realizado pelas bolsistas do Curso de Gastronomia e professor. As atividades se justificam em decorrência da solicitação do Conselho da Comunidade, pois observou-se que uma grande quantidade de alimentos era preparada e, após envio para as galerias, era desperdiçada. Entre as causas estava o fato de não terem cozinheiros/apenados preparados para desenvolverem a atividade. Uma das causas do desperdício apontadas pelos profissionais do complexo e por alguns apenados era a qualidade da comida, considerada muito ruim. Inicialmente, em 2018, foram realizadas atividades voluntárias que permitissem compreender a dinâmica do processo de produção como um todo. Buscou-se perceber o processo de recebimento de alimentos, o estoque, a produção e a distribuição. Nesse período, constatou-se que não há uma regularidade nas entregas dos produtos alimentícios, principalmente, os considerados perecíveis como carnes, ovos e leite. A partir dessas experiências, no corrente ano estão sendo realizadas, semanalmente, atividades in loco, com os oito cozinheiros/apenados do presídio regional. As capacitações realizadas consistem na aplicação de procedimentos técnicos e dicas de produção, principalmente, os relacionados à padronização de cortes e cocção, assim como à incorporação de preparações que visem ao melhor aproveitamento dos insumos disponíveis no almoxarifado, em conformidade com os padrões higiênico-sanitários previstos na legislação. Segundo a legislação vigente, a alimentação no sistema prisional deverá ser preparada de acordo com as normas de higiene e de dieta, controlada por nutricionista, devendo apresentar valor nutritivo suficiente para manutenção da saúde e do vigor físico do preso. Desse modo, a inserção da universidade na comunidade através desse projeto tem realizado atividades de transformação de realidades da alimentação do complexo prisional, promovendo ações de promoção da saúde, com foco na melhoria da qualidade de vida dos usuários, tanto através de práticas culinárias higienicamente adequadas, bem como da diminuição dos desperdícios de alimentos relacionados tanto ao pré-preparo, quanto ao pós-preparo, isto é, aqueles elaborados e distribuídos nas galerias do complexo. Por fim, os resultados parciais demonstram que os cozinheiros estão cada vez mais interessados em buscar novos conhecimentos, técnicas e dicas de preparo de alimentos; sentem-se valorizados e acolhidos durante os encontros de capacitações, nos quais revelam o desejo de novos aprendizados técnicos e um sonho de vida pós-cárcere. Esses sentimentos expressam a importância da culinária enquanto prática de bem-estar e como um recurso de reinserção social. Além disso, identificou-se uma ligeira redução no desperdício de comidas que são destinados aos apenados das galerias. Percebe-se que essas atividades conduzirão a resultados satisfatórios, não apenas, no que tange aos aspectos de qualidade da comida, na redução do desperdício e na satisfação dos usuários, mas, também, em todos os aspectos sociais e humanísticos que permeiam os processos do cozinhar. 


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