BASTIDORES E REPÓRTERES EM CENA: NOTAS SOBRE O PROGRAMA NÃO CONTA LÁ EM CASA

FABIANA PICCININ, NATANY PAZ BORGES

Resumo


Este trabalho discute como os processos canônicos do jornalismo objetivo e imparcial, que balizaram a atividade por muito tempo, passam a ser complexificados e ressignificados no contemporâneo. Parte-se da ideia de que o jornalismo usa as estratégias de informalização e autenticação da narrativa para estabelecer uma nova relação com o receptor. A análise empírica foi feita no programa Não Conta Lá em Casa, veiculado pelo canal de TV por assinatura Multishow desde 2009, e que tem a proposta de mostrar, através de grandes reportagens, a realidade de alguns dos destinos menos procurados do mundo em decorrência de conflitos, guerras civis ou problemas ambientais. Partindo do pressuposto de que essas realidades são pouco - ou nada - evidenciadas pela mídia, os repórteres abordam em cada temática, as histórias, os dramas e as diferentes culturas presentes nestes locais quase inóspitos, a fim de induzirem a reflexão em seus espectadores. No que tange à linguagem audiovisual, o programa adota uma certa "permissão" para que a subjetividade e a informalidade se coloquem como orientação para atuação de repórteres e cinegrafistas. Soma-se, a isso, o fato de os episódios evidenciarem os processos de produção através da inserção dos bastidores como conteúdo, configurando uma forma pouco comum de contar histórias. Neste sentido, durante este processo em que torna público aquilo que antes era considerado da ordem do privado, os repórteres, através de episódios que podem ser considerados grandes reportagens, passam de mediadores a protagonistas da história. Metodologicamente, para compreender as transformações pelas quais o jornalismo passou ao longo dos anos, o primeiro momento do trabalho traz um panorama histórico que busca entender de que forma a imparcialidade e a objetividade se constituíram na prática jornalística desde o século XVIII até o contemporâneo. Contribuíram com o estudo Marcondes Filho, Beltrão, Marques de Melo, Muniz Sodré, Traquina e Guerra. Já no segundo momento o jornalismo de televisão foi colocado em pauta. Sua história, seus avanços e, por fim, as suas transformações foram contextualizadas com o auxílio dos autores Piccinin, Soster, Fausto Neto e Figueiredo. Após estabelecida a conceituação teórica, buscou-se verificar como os processos produtivos das reportagens do programa se colocam e, de que forma, os repórteres e cinegrafistas atuam na atração televisiva. Através de uma pesquisa qualitativa que analisou cinco episódios, foram evidenciadas quatro marcas identitárias: a atorização do repórter, a inserção dos bastidores, o jornalismo como reality show e o repórter herói. O estudo, portanto, constatou que a opção em levar ao público o que antes pertencia somente à ordem do privado, não só desprende o repórter de um certo rigor de atuação, como tem a intenção de estabelecer uma maior aproximação com o telespectador. Ele agora passa a vivenciar, junto com a equipe jornalística, os dilemas, as vitórias e os demais passos da produção.


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