COZINHAR, PENSAR E RESSIGNIFICAR: SOBRE O LUGAR DAS OFICINAS TERAPÊUTICAS NO CONTEXTO DE UM CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS

MOISES ROMANINI, CAROLINA SCHNEIDER, GRAZIELA RODRIGUES LUCAS

Resumo


A partir dos referenciais teóricos da Clínica Peripatética de Antônio Lancetti e das práticas clínicas nos serviços substitutivos de saúde mental, buscamos refletir e pensar sobre o lugar das oficinas terapêuticas no contexto de um Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Outras Drogas (CAPS AD). Para tanto, faremos um relato de nossas experiências enquanto coordenadoras de uma oficina de culinária no CAPS AD III, do município de Santa Cruz do Sul, local onde atuamos enquanto estagiárias do Curso de Psicologia. Desenvolvida desde maio de 2015, a oficina de culinária ocorre semanalmente e reúne os usuários que estão em acolhimento diurno e noturno no serviço. Em virtude da alta rotatividade dos usuários, a oficina não possui um número fixo de participantes e, ainda que faça parte do quadro geral de atividades desenvolvidas no CAPS, não possui caráter obrigatório, cabendo aos acolhidos a decisão de querer ou não participar. Assim, compreendemos a oficina enquanto um momento de descontração, que não apenas permite a integração entre usuários, estagiários e profissionais do serviço, mas a valorização do potencial criativo, imaginativo e expressivo do grupo. Com o intuito de pensar sobre as diferentes identidades que o sujeito pode assumir e, consequentemente, romper com os estigmas reducionistas que existem em torno do usuário de drogas, pensamos a oficina enquanto um espaço de reflexão e ampliação das percepções que os próprios usuários têm em relação a eles mesmos. Deste modo, buscamos por estratégias que provoquem os usuários a pensarem sobre si para além das questões que perpassam a dependência química e o "mundo das drogas", numa tentativa de fazer com que se percebam enquanto sujeitos que não se resumem à sua doença e nem aos estereótipos de "drogado" e/ou "alcoólatra". É nesse sentido, pois, que também percebemos a oficina de culinária como um dispositivo potente para a realização de uma terapia peripatética, ou seja, de um trabalho que não se debruça sobre o usuário, mas que desterritorializa o contexto e o setting terapêutico, convidando esse usuário a se movimentar para fora dos espaços de reclusão convencionais. Deste modo, mais que mostrar a potência das oficinas terapêuticas para o trabalho clínico em serviços de saúde mental, é de nosso interesse também problematizar o engessamento dos lugares onde tradicionalmente esse clinicar acontece, ou seja, dentro de uma sala ou de um consultório médico. Assim, ainda que não seja nosso objetivo questionar a eficácia de tais espaços no tratamento da dependência química, buscamos atentar sobre a possibilidade de que outros lugares do serviço - e porque não fora dele? - também sejam vistos e investidos enquanto possíveis espaços de encontros e de engate terapêutico.


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