ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: MUDANÇAS NOTÁVEIS NO CAMPO DAS INCAPACIDADES
Resumo
A Lei 13.146, de 6 de julho de 2015, Estatuto da Pessoa com Deficiência, trouxe diversas mudanças, dentre elas as mudanças na forma de tratamento, tornando descabido o uso de nomenclaturas pejorativas para designar a pessoa com deficiências.Hoje em dia, não se ouve mais falar em mentecaptos, loucos de todos os gêneros, sadeus, dentre outros termos. Atualmente, a visão da pessoa que possui necessidades especiais, é a de uma pessoa comum, que é capaz de conviver com os demais membros da sociedade. O fato de ter uma necessidade física ou mental, como condição atual, permanente ou passageira, não permite o menosprezo, descaso e trato animalesco antigamente delegado às pessoas com deficiências.Desde a antiguidade a sociedade e suas leis destinavam um tratamento preconceituoso ao se referirem aos deficientes. Na vigência das Ordenações Filipinas, por exemplo, a curatela era delegada ao pai do ´´sandeu`` e este era responsabilizado civil e até penalmente pelos atos que seu curatelado viesse a praticar, portanto, se o curatelado representasse perigo à sociedade ou então se seu pai assim o considerasse, o genitor poderia fundamentando no dever de guarda e segurança até aprisionar seu filho (REQUIÃO, 2016).
No Código Civil de 1916, alguns termos deixaram de ser usados, outros foram substituídos, mas as nomenclaturas embora diferentes ainda carregavam consigo uma carga de preconceito e de desconhecimento muito grande, sendo que o cerne da questão das incapacidades nesta lei era a suposta proteção, fundada no conceito de dignidade vulnerabilidade onde a pessoa do incapaz era tida como vulnerável e por isso precisava ser protegida de terceiros que estivessem de má fé e que lhe pudessem fazer mal. (TARTUCE, 2015).A Lei 13.146, de 6 de julho de 2015, trouxe um viés um tanto diferente, baseando-se no conceito de dignidade liberdade, mudando como é perceptível o antigo cenário de nomenclaturas e tratamentos sociais degradativos.Na dignidade liberdade, pode-se notar que a pessoa para ter concretizado todos os preceitos necessários de uma vida digna, deve ter garantida a sua liberdade, a sua condição de ser igual, sem distinções, como prevê a Constituição Federal de 1988, ou seja, por este olhar a pessoa para possuir uma vida digna deve possuir liberdade para fazer suas escolhas, tendo assim autonomia de vida.No campo da capacidade civil, o fato de o deficiente não se encontrar mais no rol dos incapazes gera várias mudanças, pois, se um sujeito possui um transtorno mental, por exemplo, ele não está automaticamente inserido no rol das pessoas incapazes, dissociando assim o transtorno da necessária incapacidade (REQUIÃO, 2016).Sendo que um transtorno mental não mais é pressuposto de incapacidade, por consequência a sua presença não gera uma interdição automática. Os transtornos nem sempre privam um sujeito de sua capacidade de discernimento, e o que é determinante para a interdição é sempre a falta denoção de realidade, falta do poder de discernir a cerca de atos da vida civil (REQUIÃO, 2016).Anteriormente à vigência do Estatuto da Pessoa com Deficiência, todos os deficientes deviam ser curatelados. A curatela visa proteger a pessoa maior que padeça de alguma incapacidade ou de certa circunstância que impeça a sua livre e consciente manifestação de vontade, uma pessoa que esteja nestas circunstâncias deve ser curatelada com o intuito de proteger sua vida e os seus bens, sendo que o curador deve zelar para que o curatelado possua em todos os aspectos de sua existência em plenitude, lhe sendo garantido o direito à dignidade, tão amplamente defendido na Constituição Federal de 1988 (GAGLIANO, 2013).O fato de não ser incapaz, automaticamente gera uma atribuição de capacidade plena aos deficientes. A curatela por ser uma medida extraordinária, deve ter explícito na sentença que a concedeu todas as razões que a motivaram, sendo que a regra a partir do Estatuto é a atribuição de capacidade plena aos deficientes, podendo estes assumir matrimônio, exercer seus direitos sexuais, de parentalidade, dentre outros como qualquer outro cidadão (CABRAL, 2015).O direito à igualdade e à não discriminação é de tal importância que o Estatuto dedicou um capítulo ( capítulo II) somente para que seja abordado esse tema. O ato de não discriminar não se restringe somente às formas verbais de discriminação, mas a todos os meios pelos quais se retira um direito, mediante uma privação, um descaso ou uma forma de tratamento preconceituosa, veja-se abaixo o artigo referido:Art. 4º Toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação.A igualdade de oportunidades defendida no artigo 4º, deve ser uma igualdade material, ou seja, efetiva, que faça com que a sociedade os acolha e prepare todos os seus os seus membros, de forma a fazer com que eles interajam ou invés de serem excluídos.Ao contrário da antiga segregação pregada, o que Lei 13.146 traz é uma visão de empoderamento em busca de dignidade, empoderar-se significa ser visto, ser ouvido, tomar suas decisões, a pessoa empoderada é aquela que realiza, por si mesma, as mudanças e ações que a levam a evoluir e se fortalece (FREIRE, 1992).O Estatuto veio, portanto, trazer o poder de ser visto e principalmente ouvido por toda a sociedade civil, muito embora ainda hajam diversas mudanças que foram ocasionadas, está foi uma das mais significativas.O surgimento da figura da Tomada de Decisão apoiada, concedeu às pessoas portadoras de deficiências mais autonomia, pois, agora estas pessoas podem escolher algumas pessoas de sua confiança, independente de possuir vínculos familiares ou não para que estes escolhidos lhe auxiliem nas decisões cotidianas. Não ocorre uma representação como a da curatela e sim um auxílio.A escolha do deficiente é privilegiada, pois, com base na confiança que este possui nas pessoas ao seu redor, ele escolhe pelo menos duas pessoas idôneas para lhe ajudarem a tomar certas decisões referentes à sua vida, mas como dito essas duas pessoas lhe auxiliam, todavia quem toma de fato as decisões é o portador de deficiências (REQUIÃO, 2016).São muitas as questões levantadas pelo Estatuto, mas o que se destaca como pode ser observado na visão dos autores citados e até mesmo pela leitura da Lei 13.146, de 6 de julho de 2015, é a preocupação em dar autonomia, liberdade e voz a toda essa coletividade que vem sendo por séculos esquecida e que agora no cenário atual pode fazer as suas próprias escolhas, gerindo assim de forma consciente suas vidas.
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