DE KANNER À ONTOEPISTEMOGÊNESE: TECENDO NOVOS OLHARES PARA O AUTISMO.

Yanaê Maiara Meinhardt, Nize Maria Campos Pellanda

Resumo


Este trabalho aborda as concepções sobre o autismo, traçando seu percurso histórico marcado pelo saber biomédico, até a atualidade, em que emergem outras percepções deste transtorno em uma perspectiva complexa. Tem como objetivo expor as diferentes concepções sobre o autismo, relatando um processo histórico, qual a perspectiva complexa também se apropria ao lançar mão do conceito de ontoepistemogênese, possibilitando outros olhares para o TEA. Este tema emerge da pesquisa "Na ponta dos dedos: o iPad como instrumento complexo de cognição/subjetivação" vinculada ao grupo de pesquisa GAIA, que opera sob à luz do Paradigma da Complexidade - conceituado por Edgar Morin-, articulando os eixos educação e complexidade na construção do conceito de ontoepistemogênese. A metodologia do projeto consiste em atendimentos semanais de crianças autistas, utilizando tablets para disparar processos de cognição/subjetivação que emergem do acoplamento humano-tecnológico, amparando suas intervenções no pensamento complexo. Para compor a análise, realizo um recorte da pesquisa, expondo o percurso histórico do autismo que tem início na virada do século XVIII para o XIX, inaugurado pela psiquiatria ao utilizar o diagnóstico de "idiotia" para abranger a psicopatologia da infância e adolescência, que se referia também ao retardo mental, psicoses e esquizofrenia infantil. Isto permitiu que estes conceitos se confundissem, sendo o autismo concebido por Eugen Bleuler e Leo Kanner nos anos 40 como um dos principais sintomas da esquizofrenia e, portanto, de uma psicose infantil. Na mesma década, Hans Asperger atribui ao autismo uma deficiência biológica, sem especular aspectos psicodinâmicos, enquanto Kanner priorizava fatores psicológicos em detrimento dos orgânicos. Na década de 60 as teses biológicas crescem e ganham aval de Kanner, o cognitivismo também ganha força com Michael Rutter, ao relacionar o autismo com um déficit cognitivo e descartando-o como uma psicose. Com as influências da psicanálise, até os anos 70 a concepção psicogênica vigora sobre o autismo, sendo-o tratado como um transtorna das fundações do psiquismo infantil, o que desencadeou erroneamente na culpabilização das mães o quadro de seus filhos. A partir de 1980, as concepções psicanalíticas sobre o autismo sofrem mudanças inspiradas pela vertente lacaniana, que concebe uma visão estrutural da constituição do sujeito, em que se articulam a linguagem e o corpo, na mesma década em que a psiquiatria descarta o autismo como psicose. Ao trilharmos outros caminhos para a compreensão do TEA, propomos o termo da ontoepistemogênese - em uma perspectiva autopoiética concebida por Humberto Maturana e Francisco Varela-, que se refere ao processo de complexificação de um sujeito que, ao acoplar-se com o seu ambiente, transforma-se integralmente com repercussões em todas as dimensões de seu ser, cujo o processo da autoconstrução é inseparável dos processos de fluxo vital, na construção de resposta inventiva às perturbações externas e através da energização das conexões e pertencimento às redes. Nesse sentido, destacam-se como resultados dos atendimentos, a produção de autonomia e a interação nos modos que os sujeitos se lançam no mundo, positivando a singularidade. Conclui-se que o conceito de ontoepistemogênese ampara as diversas dimensões que atravessam os processos de cognição/subjetivação dos sujeitos, tecendo novos olhares autonomizadores para o TEA, dando lugar ao caos e criatividade.


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