'PENSAMENTO COMUNICACIONAL' DA LAVA JATO: FRAGMENTOS DE LEITURA DO JUIZ SERGIO MORO

Marco Aurélio Prass, Antonio Fausto Neto

Resumo


Neste trabalho estudamos algumas estratégias de midiatização adotadas pela força-tarefa da denominada Operação Lava Jato, deflagrada em março de 2014 e ainda em voga. Analisamos articulações e atravessamentos ocorridos entre circuitos e lógicas de atuação jurídica e midiática, especificamente as que servem de referência aos processos de visibilidade das operações do campo jurídico. A metodologia empregada, de natureza descritiva, corresponde ao exame de discursos de atores do campo jurídico envolvidos na investigação, principalmente fragmentos enunciativos de falas do juiz federal Sergio Fernando Moro – personagem central desta operação de caráter judicial-midiático – que introduzem a mídia como elemento constituinte de suas estratégias. Assim, mapeamos e descrevemos diversas referências midiáticas e acenos à “opinião pública” em declarações prestadas pelos atores jurídicos, principalmente por meio da imprensa em eventos ou entrevistas, porém, averiguamos também um artigo acadêmico de Moro, trechos de palestras, despachos e sentenças variadas do magistrado.  Nossa hipótese, portanto, sustenta que o juiz Sérgio Moro recorre de modo sistemático às lógicas do campo midiático e faz referências à “opinião pública” para justificar suas ações judiciais. Para exemplificar nossa hipótese, relacionamos alguns conceitos convergentes, como os de midiatização, circuitos e circulação, sobretudo a noção de junção e atravessamento dos campos sociais, levando a uma compreensão dos complexos fluxos circulatórios observados na Lava Jato. Em uma segunda parte do trabalho, elencamos quatro momentos-chave de falas do juiz que podem trazer referências do que chamamos neste trabalho de ´pensamento comunicacional´: 1) palestra no Fórum da ANER – Moro versa sobre a publicidade dos dados da operação e pede apoio à imprensa; 2) pedido de escusas ao Supremo Tribunal Federal, em que cita a publicidade do processo; 3) palestra na Alemanha, em que afirma que desde o início das investigações foi decidido que não “esconderiam” nenhuma informação do público; e 4) condução coercitiva do blogueiro Eduardo Guimarães, destacando a mudança de postura do magistrado após críticas de entidades jornalísticas. Feito isso, exemplificamos alguns conflitos internos no campo jurídico em função de posicionamentos da força-tarefa da Lava Jato. Em nossas considerações finais, concluímos que a importância da publicidade dos processos por parte de Moro foi registrada em 2004 em referência à operação italiana Mãos Limpas. Com o estabelecimento de um processo semelhante no Brasil, o modus operandi italiano, baseado em estratégias midiáticas, serviu como um espelho. Observamos que o campo jurídico é “contaminado” pelas lógicas do campo midiático para prover midiatização. Da mesma forma, os múltiplos circuitos entre setores/processos de sociedade são possíveis pela apropriação das lógicas midiáticas por necessidade de interação entre agentes internos e externos dos campos, o que leva a tensões e mudanças estruturais. Os quatro momentos-chave reforçam nossa hipótese por evidenciar a “necessidade” de publicidade total dos processos, pelo apelo à “opinião pública”, pelo flerte com a imprensa e vazamentos de dados bem como os pedidos de apoio à imprensa, e demonstram a complexidade dos fluxos circulatórios da operação, envolvendo força-tarefa, imprensa, sociedade e redes sociais.

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