BIOPOLÍTICA, MULHERES NEGRAS E VIOLÊNCIA DE GÊNERO

Maria Carolina Magedanz, Luana Molz Rodrigues, Mozart Linhares da Silva

Resumo


A violência de gênero é um fenômeno mundial que ocorre em todas as esferas da sociedade, mas principalmente em âmbito doméstico. Caracteriza-se como crimes de ódio, fundamentados em valores sociais e culturalmente construídos e apresentam, muitas vezes, desfechos fatais. Tais crimes podem ser expressos por agressões físicas, psicológicas, sexuais e patrimoniais, geralmente contra as mulheres. Este estudo, que é parte do projeto “Educação, Biopolítica e produção de subjetividades (não)raciais no Brasil”, problematiza esse fenômeno a partir das lentes da biopolítica, conforme as teorizações do filósofo Michel Foucault. A biopolítica aponta para um tipo de poder exercido sobre a população, trata-se de colocar a vida nos cálculos políticos do Estado. A violência, como tal, pode ser pensada a partir da biopolítica, pois se constitui como fenômeno que se situa no limite da vida, implica em riscos sociais e individuais e precisa ser considerado a partir das estratégias de controle e segurança. Nesse sentido, a biopolítica regula a população, através do estabelecimento de regras e padrões de comportamento, funcionando, assim, como normalizadora não apenas dos corpos, mas das relações sociais. Desse modo, a existência de um modelo hegemônico de ser e estar no mundo, como o modelo patriarcal, baseado na heteronormatividade, no racismo estrutural e na ideia de democracia racial no Brasil, fundamentam a perpetuação e legitimação de algumas formas de violência e do não reconhecimento delas como tais. A par dessas considerações, a pesquisa tem por objetivo analisar o fenômeno da violência de gênero, sobretudo contra mulheres negras no Brasil. O estudo em pauta caracteriza-se como documental, considerando as seguintes fontes como corpus analítico: o Mapa da Violência (2015), Panorama da Violência (2018), Atlas da Violência (2018/2019), Visível e Invisível: a vitimização de mulheres no Brasil (2019), além dos registros obtidos através do Sistema de Informação de Agravos de Notificação entre 2009 e 2017, entre outros. Posto isso, é possível verificar uma cultura de subnotificação dos registros de violência de gênero, bem como de feminicídio, além do crescimento dos registros de violência de gênero através dos anos 2009 e 2017. Destes registros, destaca-se que o maior alvo da violência de gênero e, também da violência letal, são as mulheres negras, ou seja, pretas e pardas. Tais dados também mostram que, em sua maioria, os atos são cometidos pelos companheiros das mulheres e ocorrem dentro de suas residências, indicando a perpetuação da violência de gênero e do racismo estrutural, presente no cerne do patriarcado e mantidos pela suposta democracia racial. Conclui-se que as diversas formas de violência de gênero que as mulheres, especialmente mulheres negras, sofrem estão diretamente relacionadas à cultura patriarcal que, não só o machismo e o modelo heteronormativo, como também o racismo e a ideia de democracia racial se constituem no país. Além disso, lacunas nos registros de informação sobre violência de gênero, dificultam a criação de políticas públicas capazes de combater tal problemática. Também demonstram a incapacidade das políticas públicas, já existentes, garantirem o acesso aos serviços públicos que estas mulheres necessitam, o que se configura, também, como uma forma de violência por parte do Estado.

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