A APRECIAÇÃO DOS CONTRATOS IMOBILIÁRIOS SOB O VÉU DO PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE – FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO – UM MEIO DE ASSEGURAR OS DIREITOS DO COMPRADOR FRENTE VÍCIOS REDIBITÓRIOS

Priscila de Freitas

Resumo


Primeiramente, parte-se da análise sobre a temática da “constitucionalização do direito privado”. Como herança do liberalismo, o Estado não intervia nas relações entre particulares, sendo assim, havia uma Constituição para regular a atuação do Estado (Direito Público) e um Código Civil para regular as ações entre particulares (Direito Privado), ou seja, existia uma dicotomia público-privado. Neste âmbito podemos situar os direitos de primeira geração, quais sejam, os direitos individuais.

Após, com o advento do Estado social, passou-se a uma esfera de direitos de segunda geração, direitos intitulados de sociais, os quais exigiam uma posição ativa do Estado, como, por exemplo, o direito a assistência social, saúde, educação, trabalho, dentre outros. Após a 2ª Guerra Mundial, o mundo presenciou a necessidade de uma intervenção mais consistente do Estado, passou-se a uma terceira geração de direitos fundamentais, onde houve o “desprendimento e redimensionamento da titularidade dos direitos fundamentais, que antes eram eminentemente vinculados aos sujeitos, para oferecerem uma órbita de proteção a determinados grupos sociais.” (FINGER, 2000, p. 90). Tais direitos de terceira geração receberam a denominação de direitos sociais, ou de fraternidade.

No Brasil, com o advento da Constituição de 1988, compreendida como a “Constituição Cidadã” é que tais direitos de terceira geração foram incorporados em sua plenitude. Sendo assim, passou a ser possível verificar uma intervenção estatal nas relações entre particulares, podem-se vislumbrar princípios fundamentais que irradiam sobre as relações entre particulares. A partir desses direitos de terceira geração e a falta de soluções para as novas demandas sociais no Código Civil, visto que este se encontrava sob forte influência liberal, surgiram normas como a Lei do Direito Autoral, Lei das Locações Urbanas, Condomínios Verticais, Estatuto da Terra, Código de Defesa do Consumidor, Estatuto da Criança e do Adolescente. (FINGER, 2000).

Diante de tal retrospecto, é possível constatar que a dicotomia público-privado, com o advento constitucional de 1988, já não pode mais ser vislumbrada tão objetivamente. A “força constitucional” passou a irradiar sobre as relações entre particulares. O marco fundamental para a aplicação dos direitos fundamentais nas relações entre particulares, como traz Cunha (2010, p. 103) é o caso Lüth, discutido pela Corte Constitucional Alemã, a autora, citando Sarlet (2007), aponta que, diante de tal julgamento, constatou-se que os direitos fundamentais não exercem função apenas de direitos subjetivos de defesa do indivíduo frente ao Estado, mas que, além disso, tratam-se de decisões valorativas que possuem natureza jurídico-objetiva da Constituição, tendo eficácia por todo o ordenamento jurídico e, assim, devendo servir de diretrizes para a atuação do Estado.

Frente a isso, tem-se que o Estado deve desenvolver normas para que os direitos fundamentais sejam tutelados e interfiram nas relações entre particulares, quando houver lesão ou ameaça de lesão, fazendo com que os particulares respeitem os direitos dos outros, sem causar-lhes prejuízo. Reis (2005) explica que, diferentemente da eficácia vertical dos direitos fundamentais, onde havia a imposição de limites negativos do Estado, na questão horizontal, encontram-se deveres de proteção impostas ao Estado para que atue, de forma preventiva ou repressiva, inclusive nas relações entre particulares onde ocorrer ofensa a direitos fundamentais.

Passando-se para o tema contratos, importante destacar que a origem destes remonta aos códigos francês e alemão. Contrato entre duas pessoas, as quais designam cláusulas, preço, prazos, condições de pagamento onde a autonomia da vontade é basilar. Anteriormente, quando o modelo liberal era presente no sistema brasileiro, o Estado não intervia nas relações entre os particulares. Porém, é importante ressaltar que, em decorrência da Constituição Federal de 1988 e a irradiação de seus poderes aos diversos ramos do direito, o Código Civil traz, em seu artigo 421, que a liberdade de contratar deverá observar os limites da função social do contrato. (VENOSA, 2012).

Venosa (2012, p. 363) traz que “ao contrário do que inicialmente possa parecer, o contrato, e não mais a propriedade, passa a ser o instrumento fundamental do mundo negocial, da geração de recursos e da propulsão da economia.”. O autor aponta também a forte importância do interesse social no contrato. O direito privado abre-se para a constituição, onde “o presente Código procura inserir o contrato como mais um elemento de eficácia social, trazendo a ideia básica de que o contrato deve ser cumprido não unicamente em prol do credor, mas como benefício da sociedade.” (VENOSA, 2012, p. 363).

Ao fazer uma breve análise quanto aos vícios, constata-se que um dos mais recorrentes é a lesão, onde uma parte, valendo-se da inexperiência da outra ou de necessidade desta, atribui vantagem a si mesmo, sendo tal vantagem notavelmente desproporcional ao resultado que seria obtido se a mesma não houvesse. O Código de Defesa ao Consumidor traz inúmeros instrumentos contra a abusividade, tratando como nulas cláusulas que resultem em grande desproporção para as partes, o que será analisado posteriormente na pesquisa.

O Princípio a ser utilizado a fim de responder a questão prevista é o da solidariedade, que já resta consagrado em relações como as de consumo, direito ambiental, visando a proteção do meio ambiente, nas relações familiares, visto seu caráter de direito fundamental presente na Constituição, devendo, de tal forma, irradiar nas relações entre os particulares e, neste caso, fazendo com que a função social dos contratos seja respeitada.

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