DO "GRITO BÁRBARO SOBRE OS TELHADOS DO MUNDO" AO LEITO DE MORTE: UMA CAMINHADA ENTRE AS FOLHAS DE RELVA DE WALT WHITMAN

FERNANDO MULLER KREBS, NORBERTO PERKOSKI

Resumo


"Encontros com a Poesia" é um projeto vinculado ao Grupo de Pesquisa "Estudos Poéticos", coordenado pelo Prof. Dr. Norberto Perkoski, do Departamento de Letras e do Programa de Pós-Graduação em Letras - Mestrado da UNISC e consiste em reuniões semanais nas quais realizamos momentos de leitura, fruição e discussões acerca de obras poéticas de variados sistemas literários. Neste ano, dando seguimento ao enfoque na poesia ocidental, contemplamos os autores de língua inglesa. Um dos poetas abordados é Walt Whitman, reconhecido pelo crítico literário Harold Bloom como o centro do cânone americano e considerado um dos principais responsáveis por alterar os rumos da poesia moderna, antes mesmo de Baudelaire e Rimbaud. Whitman escreveu um único livro de poemas ao longo da vida, "Folhas de relva", que passou por sucessivas reedições (sete, ao todo), tendo seu conteúdo alterado, fragmentado e aumentado a cada nova publicação: a original, de 1855, contém doze poemas longos, enquanto a última, de 1892, apresenta mais de quatrocentos escritos. A intenção deste trabalho é esboçar as principais diferenças formais (técnica, estrutura e estilo) e temáticas percebidas entre a primeira e a última edições, fazendo alusões às influências que o contexto histórico e social dos estados americanos e a vida pessoal do poeta tiveram sobre o teor de sua obra, pois, de fato, em Whitman, e a maioria dos críticos está de acordo a respeito, autor e obra se confundem, são inseparáveis. O livro lançado em 1855 é tido como a declaração de independência da poesia americana. É ele o responsável pelas grandes inovações formais e temáticas que viriam a despontar no modernismo ao redor do mundo. É a edição original que antecipa os anseios de liberdade e democracia; que afirma a união dos contrários (o corpo e a alma, o público e o privado, o masculino e o feminino, o humano e o kosmos); que traz à pauta as liberdades individual, sexual, política, poética e de linguagem; que aborda as questões de seu tempo (o agora); que busca e leva a poesia para as ruas, para os espaços abertos, em linguagem simples, a todas as pessoas, sem distinções; que trata dos temas polêmicos e caros à sociedade conservadora (sexo, homossexualismo, religião, autoerotismo, racismo, metempsicose, corrupção); enfim, dentre muitos outros aspectos temáticos e discursivos, antes de Rimbaud ("Je est un autre"), Whitman já cantava ao mundo que seu "eu" era todos os outros (inclusos aqui seres, plantas, mares, a Natureza e o Universo). É também no livro original que surge o verso livre, principal legado formal deixado pelo bardo americano. Aliterações e assonâncias, paralelismos, vasto vocabulário, técnica de catálogos, retórica rapsódica e criação de imagens também são marcas constantes na poesia whitmaniana. Com o crescimento dessa obra-em-progresso, a "Edição do leito de morte", de 1892, deixa para a história um Whitman já mais contido, ainda revolucionário, lírico e provocativo, mas que cede um pouco às estruturas convencionais. Nessa edição, o poeta atenua alguns trechos e temas polêmicos, divide o livro em seções, compõe versos mais enxutos, demonstra um tom lúgubre, de reminiscências e certa obsessão pela morte que se aproxima. É tarefa difícil condensar a homérica criação do poeta do kosmos, portanto, o que pretendemos aqui é apresentar alguns aspectos essenciais dessa obra que segue influenciando gerações, mais de cento e cinquenta anos após sua primeira aparição.


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