“A TINHA MORTO POR RAIVA DELA”: A VISÃO DE LIBERDADE ASSOCIADA À EXPECTATIVA EM TORNO DOS QUILOMBOS

Cícero Augusto Richter Schneider, Roberto Radunz, Olgário Paulo Vogt

Resumo


Durante o período da escravidão no Brasil, que durou aproximadamente quatro séculos, os negros cativos, buscando sua liberdade, fugiam do domínio de seus senhores, reunindo-se em refúgios conjuntos, localizados em regiões de difícil acesso e escondidos no meio das matas. Esses locais ficaram conhecidos como quilombos, sendo o mais conhecido o Quilombo dos Palmares, associado à figura de seu líder, Zumbi dos Palmares, mas existindo por todo o território brasileiro, inclusive Província de São Pedro do Rio Grande do Sul. Contudo, a realidade nesses refúgios era dura e precária, e seus integrantes, diariamente ameaçados pela possibilidade de recaptura e conflitos. Isso levava alguns a preferirem a segurança proporcionada por seus senhores, mesmo sob o regime de trabalho, à vida incerta nos quilombos. Este trabalho tem por objetivo analisar a oposição entre a visão de liberdade associada à expectativa em torno dos quilombos, e a realidade dos mesmos, tendo por base o processo criminal do preto Caetano, que relata a fuga e arrependimento do dito escravo, levando-o a cometer o crime de homicídio contra outra cativa. (APERS – Cível e Crime, N. 2931, M. 3, E. 56). No ano de 1847, na Vila da Cachoeira (atual Cachoeira do Sul), foi instaurado um processo-crime que acusava o preto Caetano, escravo de Francisco José da Silva Moura, de um quilombo existente na Costa da Serra, ter assassinado a também fugida preta Antonia, escrava de Agostinho Francisco Ilha, com marteladas na cabeça. O crime foi descoberto com a recaptura de alguns cativos fugidos, entre eles o réu, pelo grupo do capitão do mato Manoel Vicente de Carvalho. O motivo que teria levado ao homicídio seria o arrependimento de Caetano pela fuga e a raiva contra Antonia, por esta tê-lo convencido a realizá-la. Esta pesquisa foi baseada, principalmente, na transcrição e análise do processo-crime do preto Caetano. A partir, dessa fonte primária, o mesmo documento foi contextualizado por meio de análises conjuntas com os orientadores e de bibliografias referentes ao tema. Além disso, foi feito uso do Código Criminal do Império, de 1830, como legislação de suporte. O aporte teórico utilizado inclui-se na dimensão da História Social, relacionado com a abordagem da Micro-História. No momento, o trabalho possui apenas resultados parciais, encontrando-se em fase de análise bibliográfica sobre a situação dos quilombos. Com o processo transcrito e analisado, o presente estágio do desenvolvimento da pesquisa visa analisar a realidade da vida e da estrutura desses locais, além das necessidades existentes para que os mesmos se mantivessem, levando em conta as redes de trocas e contatos, em detrimento da visão de liberdade que era construída sobre os quilombos. Utiliza-se, nesse ponto, a conjectura sobre os motivos que, no processo criminal, teriam levado o pardo Caetano a se arrepender de ter fugido para um quilombo e assassinado aquela que o convenceu. Após realizados os trâmites do processo, inquirição de testemunhas e testemunhas informantes, o réu Caetano foi declarado culpado pelo Juiz Subdelegado Jacinto Franco de Godoy, incurso no artigo 192 do Código Criminal do Império. Foi, por fim, sentenciado à prisão e livramento.


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